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Do Chade para Lavras, a obstinação de Youssouf em busca do sonho olímpico

Sabe aquela expressão brasileira típica: “Depois passa lá em casa”? Youssouf Mahamat Goubaye, de Chade (país no centro-norte da África), levou ao pé da letra. O velocista, que disputou os 200m do Ibero-Americano de Atletismo, no Estádio Olímpico do Rio de Janeiro, aceitou o convite feito pelo técnico Fernando Roberto de Oliveira e, com esforço e determinação, deixou Djamena, sua cidade natal, para desembarcar em Lavras, no interior de Minas Gerais.
 
O convite surgiu em conversa informal no aeroporto de Cali, na Colômbia, após o Mundial de Menores, em julho de 2015. Fernando Oliveira esperava o voo e batia um papo com um treinador português, quando Youssouf sentou ao lado deles. A partir daí, o diálogo passou para o francês, língua do Chade: “Perguntei de onde ele era e ele contou a história dele... O que me causou surpresa foi ver um rapaz tão jovem sair de seu país, chegar na Colômbia sozinho, fazer credenciamento, participar de congresso técnico. É diferente participar de um evento internacional desse nível sem dominar inglês, sozinho e sobreviver tranquilo”, relembra o professor de Educação Física da Universidade Federal de Lavras (Ufla).
 
Youssouf e Fernando: parceria teve início de forma inusitada, numa conversa num aeroporto na Colômbia. Foto: Miriam Jeske/Brasil2016.gov.brYoussouf e Fernando: parceria teve início de forma inusitada, numa conversa num aeroporto na Colômbia. Foto: Miriam Jeske/Brasil2016.gov.br
 
Quando o corredor contou a realidade do atletismo em sua terra natal, Fernando fez o convite para Youssouf conhecer Lavras. A universidade estaria pronta para recebê-lo. “Só que eu não dei a devida importância. Se realmente ele desse jeito, acabaria levando, mas não dei muita força e não acreditei que fosse acontecer”. No entanto, para o atleta aquela era a oportunidade de conseguir melhorar na carreira. “As pistas de Chade são muito ruins, aqui é bom para fazer competições. Diferente. No meu país não tem pista normal”, diz Youssouf.
 
Após a conversa na Colômbia, o atleta não falou mais com o técnico brasileiro nem tinha seus contatos. A próxima chance de reencontro foi no Mundial de Pequim, em agosto do ano passado. Youssouf encontrou o brasileiro João Vitor de Oliveira, corredor dos 110m com barreiras, e pediu ajuda para encontrar Fernando. “Aí o João Vitor pensou que era o professor Luiz Roberto, ex-treinador do Joaquim Cruz, que trabalhava com uns africanos. Mas o Luiz disse que não conhecia o Youssouf. Engraçado que recentemente o João se lembrou disso quando viu a foto dele lá em Lavras: ‘Pô, esse moleque me procurou, que felicidade! Coisa louca, o cara está em Lavras mesmo”.
 
Tudo pela internet
Sem sucesso na empreitada, o atleta africano recorreu às redes sociais. Desta vez deu certo e ele retomou o contato com Fernando. “Falei para ele que não podia pagar a passagem, mas que se ele conseguisse isso, em Lavras a gente teria moradia, alimentação e estudos. Aí ele ficou dois meses conversando comigo”. Quando o professor começou a achar que o projeto não iria para frente, Youssouf deu a notícia: “Comprei a passagem”. O atleta vendeu celular, computador, trabalhou semanas para juntar dinheiro e ainda contou com a ajuda do pai.
 
Youssouf em ação durante o Ibero-Americano de Atletismo, evento-teste no Estádio Olímpico do Rio. Foto: Washington Alves/CBATYoussouf em ação durante o Ibero-Americano de Atletismo, evento-teste no Estádio Olímpico do Rio. Foto: Washington Alves/CBAT
 
Pronto. Mas, e os documentos? “Ele descobriu que não tinha representação diplomática do Brasil no Chade e a mais próxima era em Camarões. Foi mais uma novela. Ele tinha que localizar documentos escolares, parece que no Chade a coisa não é bem organizada”, relata o treinador, com um sorriso de felicidade por poder contar a história. Fernando ajudou no contato com a embaixada e Youssouf pôde fazer tudo pela internet. Do Chade, o atleta seguiu para Adis Abeba, capital da Etiópia (sentido leste), para depois cruzar a África rumo ao oeste e desembarcar em São Paulo. Neílton Moura, treinador da BMF, recebeu o visitante a pedido de Fernando e o colocou num ônibus rumo a Lavras.
 
“Quando ele chegou, eu olhei: ‘Rapaz, você veio mesmo. Sou obrigado a reconhecer que vou ter que tratá-lo de forma especial, porque você conseguiu”, Fernando descreve, olhando para a pista do Estádio Olímpico. Um olhar de alegria e esperança. “Você viu a combinação de fatos? Tem uma energia aí, que fez com que ele se atraísse pela ideia”.
 
Aprimoramento técnico e no idioma
Há três meses no Brasil, Youssouf, que vai completar a maioridade em 27 de junho deste ano, tem se adaptado bem ao país. Mulçumano, ele disse que a única dificuldade com a alimentação é não comer carne de porco. Nada de feijoada.
 
Na universidade, o chadiano se esforça para aprender o português, idioma em que já se comunica bem. Ele ainda ensina francês aos colegas, que se esforçam para aprender. “No primeiro momento eu não sabia conversar. Tive dificuldade. Falava em francês com o professor Fernando e alguns amigos”. O uso de tradutores, em celular ou no computador, também ajudou no aprendizado da língua.
 
No dia seguinte à chegada em Lavras, Youssouf já foi fazer o que mais gosta: correr. “Percebemos que ele é talentoso, mas tem desequilíbrios musculares. Ainda falta técnica. Ele não tinha o hábito de treinar todos os dias no país dele. Agora está adquirindo”, avalia Fernando. “Pouco a pouco ele está tomando corpo e melhorou dimensões técnicas da corrida. Ele tinha inflamações sérias na canela, que o impediam de treinar direito. Descobrimos uma fragilidade em termos de força muscular”, prosseguiu. Mesmo assim, o corredor conseguiu boas marcas. Na eliminatória dos 200m do Ibero-Americano, ele fez 21s39, melhor tempo dele no ano. Na primeira semifinal, Youssouf chegou em oitavo com 21s44 e ficou fora da final.
 
“Essa é a sétima competição dele. Antes de vir para o Brasil ele tinha participado de quatro. Treinava para os campeonatos e depois ficava um tempão sem treinar. Ele jogava futebol também, na família dele tem muito boleiro. Pensei: ‘Se o cara sem fazer nada, conseguiu esses resultados, é porque é bom para caramba’. Alguém que consegue construir para sua vida uma história dessa, é alguém com um espírito guerreiro”, define Fernando.
 
A paixão pelo futebol, aliás, fez a família de Youssouf se aproximar do Brasil antes mesmo do filho morar aqui. “Eu conversei com muitas pessoas do meu país. Meu pai gosta que eu viva aqui. Uma pessoa na universidade me disse que eu poderia fazer estágio nos Estados Unidos, mas meu pai disse que não. Eles gostam do Brasil. Desde pequeno torcemos pelo Brasil no futebol”.
 
Rede Nacional
O Centro Regional de Iniciação ao Atletismo (Cria – Lavras) começou como um projeto de extensão da Ufla. Ao ver que o filho queria começar a treinar atletismo, Fernando Oliveira convidou outras crianças para iniciar uma escolinha. “Montei um grupinho para meu filho não correr sozinho e chamei algumas crianças. Acabou que montamos um grupo forte. E fomos campeões brasileiros sub 18 em Maringá em 2012. Isso fez o projeto crescer”.
 
Pista da Universidade de Lavras, onde Youssouf faz sua preparação: montada com recursos do Ministério do Esporte, integra a Rede Nacional de Treinamento. Foto: Ministério do EsportePista da Universidade de Lavras, onde Youssouf faz sua preparação: montada com recursos do Ministério do Esporte, integra a Rede Nacional de Treinamento. Foto: Ministério do Esporte
 
Hoje o Cria atende a mais de 1500 alunos da região e conta com apoio de empresas e dos governos Federal, estadual e municipal para o custeio das despesas. Os jovens também tiveram o reforço de uma pista de atletismo nova, com oito raias, apta a buscar certificação internacional nível 2 da IAAF (Associação Internacional das Federações de Atletismo, na sigla em inglês). A estrutura foi construída com recursos de R$ 9,6 milhões do Ministério do Esporte e integra a Rede Nacional de Treinamento.
 
“Você ver crianças carentes, a maior parte recebendo Bolsa Família, morando em casas feitas pelo governo e, apesar das dificuldades, elas conquistaram essa pista, é motivo de orgulho absurdo”, afirma Fernando Oliveira, que explicou que antes a pista era de terra (saibro).
 
Uma estrutura que pode fazer a diferença para o talento de Youssouf despontar. “Aqui no Brasil tem muita competição e elas são com cronômetro digital. No Chade, muitas competições nacionais não têm e você não sabe o tempo que fez”, compara o corredor, que tem grandes chances de ser o indicado pelo seu país nos Jogos Rio 2016. No atletismo, as nações podem indicar um mínimo de competidores, mesmo sem índice. Se conseguir, ele com certeza se sentirá correndo em casa.
 
Gabriel Fialho, do Rio de Janeiro 
Ascom - Ministério do Esporte 
 
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